sexta-feira, janeiro 13, 2006

Medicinês

Sempre tive um completo desinteresse pelo mecanismo das coisas. Pelos carros, por exemplo, que gosto muito de ver, tudo o que sei é que uns tais duns cavalos têm alguma coisa a ver com a sua velocidade, o que influencia a minha decisão de compra, e que há um sitio para meter óleo, outro para meter água e outro para meter combustível. Sei que os carros têm para lá uns pistons, e mais umas cenas que não me interessam para nada. Para mim, conseguir arrastar uma tonelada de metal e plástico com um simples girar de uma chave e umas pisadelas num pedal, continua a ser um milagre inexplicável. E eu gosto que assim seja. Com o interior do corpo humano, passa-se o mesmo. Tenho umas noções vagas sobre o mesmo: que se o coração parar um gajo morre – salvo se nos pregarem uns choques com aqueles ferros de engomar estilizados – que os pulmões têm a ver com respirar, que um gajo consegue sobreviver sem um rim, que temos intestinos e bexiga e mais umas cenas que servirão para alguma coisa. Como é que isto tudo funciona? Mais uma vez, aposto no milagre e sinto-me bem assim.
Provavelmente por isto, sempre fugi de médicos. Não tenho medo de ir ao médico, nem mesmo a dentistas. Achava, e acho, enfadonho discutir o meu interior, ainda mais com alguém que utiliza uma linguagem que, para mim, é uma mistura de latim com a linguagem dos pês. Ininteligível, portanto. Com o tempo, essa barreira criada por língua galáctica criou-me irritação, porque me parece uma codificação excessiva, destinada à criação de um monopólio de saber. Uma vez, já pensava que um determinado centro clínico não tinha “dentistas”. Afinal tinham, mas chamavam-lhes gastro não sei quê. Várias pessoas gozaram comigo, e tentaram-me explicar a razão pela qual a expressão “dentista” era limitativa da actividade dos médicos da tal gastro não sei quê. Caguei. Dói-me um dente, ou penso que me dói um dente, é-me igual, e eu quero saber a quem me posso dirigir. A designação correcta de um “automóvel” também não será “automóvel”, mas eventualmente “Grande bloco de chapa, assente em volumes cilíndricos de borracha”. Mas houve alguém que se preocupou em descodificar a coisa, e torná-la perceptível para o comum dos mortais. Isto não quer dizer que todos os médicos alinhem nisto. O meu médico actual, de Clínica Geral, é o melhor exemplo do gajo que sabe que, no âmbito da sua função, tem que lidar com terminologia digna de qualquer episódio do Star Trek, e que raramente alguém percebe. E quando diz que eu tenho uma “berlitoide” na “vertingustula”, logo se apressa a explicar que é uma espécie de uma pedrinha num tubo que liga o rim à bexiga. Um tubo? Uma pedrinha? Ah, isso sei o que é. E lá me desestupidifico. E a um médico que se preocupa em fazer-se compreender, como o meu, eu até vou.

NG

5 Comments:

Anonymous Anónimo said...

A minha faz desenhos para explicar o porquê de um pêlo encravado. ;)
beijo

4:53 da tarde  
Blogger Elora said...

Estomatologista?

3:30 da tarde  
Blogger NG said...

Isso!

7:03 da tarde  
Blogger JC said...

Eu dou-me muito mal com desenhos. prefiro explicar as coisas com pedrinhas e tubinhos. No outro dia utilizei uma analogia de trânsito engarrafado na auto-estrada, que justificava a realização de um túnel para escoar o trânsito... Mas de facto a deformação profissional não nos permite saber já o que é que é do domínio público ou não...

3:58 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

This is very interesting site...
» »

4:16 da tarde  

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