sexta-feira, dezembro 23, 2005

Memórias de Natal

I) A noite pareceu-me estranhamente escura, quando saí com a minha mãe dos Armazéns Grandela para uma rua repleta de gente apressada e muito agasalhada. Passamos por uma mulher que vendia a Eva do Natal (uma espécie de Cais desses tempos - 74, 75,76?), mas que ninguém comprava. Enquanto a minha minha mãe me ia arrastando de montra em montra, eu não conseguia parar de olhar para ela, vendo o desespero a crescer. De repente, os olhos delam perderam as últimas forças, e deixaram cair lágrimas. "Ajudem-me, pelo amor de Deus", ouvi eu, já a sair do Chiado.

II) Em bicos de pés, descobri a minha prenda: um comboio da Lego. Era maravilhosa a combinação do azul da linha oval, com o amarelo vivo do vagão e o encarnado das carruagens. "Mãe, quero isto!" disse, e a minhã mãe espreitou. "Não pode ser filho, é muito caro". Foi o primeiro comboio que perdi na vida.

III) O Tim estava na rua, e estava triste. E se o Tim estava triste, eu estava triste. Chegámos à meia-noite, e nem as prendas me animaram. O Tim continuava lá fora, e continuava triste. De repente, o meu pai levanta-se, vai à cozinha e pôe um bife cru num prato. Abre a porta, e deixa o Tim entrar. "Feliz Natal, pá", disse o meu pai, enquanto colocava o prato no chão. E o Tim riu-se e comeu a sua prenda. E eu fiquei feliz.

NG