segunda-feira, julho 11, 2005

A praia – como nunca a tinha visto antes.

A praia, ao contrário do que muita gente pensa, não é areia e água sem fim. Não não é. Não é um dia a torrar ao sol e a babar das 3 às 5 na toalha para acordar suadinho e desatar a correr para ir dar um mergulho. A praia para mim agora é isto:
Saco amarelo mais saco das toalhas mais a mochila com o balde, a pá, o ancinho, as formas e a peneira que ela nunca há-de saber usar, mais a máquina fotográfica e os cinco cartuchos vazios prontos para receber a mesma fotografia vezes sem conta, mais a máquina de filmar e uma cassete virgem sabe deus o que poderá a miúda fazer, mais as chaves do carro, mais o cinzeiro de praia, mais o tabaco, mais duas t-shirts de reserva porque ela só quer é água, mais o roupão para não vir nuinha e evitar uma constipação de verão, mais o chapéu de sol que não serve para nada porque ela não quer estar quieta – muito menos à sombra – um segundo que seja, mais o biberão da água que vai no saco amarelo, mais um chapéu por precaução não vá o outro voar com o vento ou ela ter um ataque de boa disposição a mandar com o que tem na cabeça para a água e mais qualquer coisa que nós nos esquecemos de trazer mas que eu tinha a certeza de ter posto no saco das toalhas e a Joana de ter visto na mala do carro. E só meti agora a primeira para sair do estacionamento.
Chegamos. Regra geral adormeceu nestes quinze minutos de viagem e acorda com o travão de mão. Tira da cadeira e assim que vê a mochila com o balde, a pá, o ancinho, as formas e a peneira que ela nunca há-de saber usar, começa um “dá, dá, dá” que só acaba na areia quando finalmente o pai ou a mãe “dão”. E começa a festa: dois passos – cai – levanta - três passos – segura - olha as pessoas - afasta - mete areia na boca - “abre a boca Carolina - tira a areia da boca - dá água - passa a menina”ai que linda” – duas velhotas em passeio “olha para esta coisinha mais linda” – sorriso e aceno concordante – dez passos – corre e segura antes que a água lhe chegue aos joelhos – volta para trás – “onde é que está mãe? Olha a mãe... vamos levar as pedrinha à mãe” – Joana vou dar um mergulho. E entra a mãe em cena: cinco passos – “vou-te apanhar” – segura – dá a mão – senta – castelo na areia – destruição maciça com um toque de pé – areia na boca - “abre a boca Carolina - tira a areia da boca - dá água – passa a senhora “quantos meses tem? És muito linda sabias?” – chega a escola com seiscentos putos aos gritos e é então que acontece a paz. Trinta, quarenta vá. Quarenta e cinco segundo ao limite de plena quietude. A Carolina pára para ver o que se passa. Quarenta e cinco longos segundo de sombra – se estiver por acaso numa – e logo a seguir: levanta – quatro passos – senta – levanta – cinco passos – mete areia na boca – deita a língua de fora e diz “cocó” – levanta e vai para a água – corre – segura – mão na mão até vir a onda pequenina – sorri-
E isto vale tudo.
Das nove às dez e meia é isto, sendo que o despertar foi à oito e a praia é já ali. Mais praia? Sim claro. A partir das cinco e tal quase seis até às sete e muito. E a dose não muda: Saco amarelo mais saco das toalhas mais a mochila com o balde, a pá, o ancinho, as formas, enfim, acho que dá para perceber.